Teoria da Inteligencia Multifocal 3

Paradoxos doentios das sociedades modernas Minha trajetória como psiquiatra, pesquisador e produtor de conhecimento sobre o complexo funcionamento da mente humana me convenceu de que a nossa espécie, em particular as sociedades modernas, está adoecendo coletivamente em seu psiquismo. Enumerarei apenas alguns paradoxos ou pontos contrastantes e a necessidade de um programa mais profundo para educar o Eu como gestor do intelecto e superar o cárcere da emoção, que não apenas inclui fobias, humor depressivo, ansiedade, obsessão, mas também a dependência de drogas/álcool: 1. O humor triste e a angústia estão aumentando. A indústria do lazer está se expandindo. Nunca tivemos uma fonte de estímulos para excitar a emoção como na atualidade. A indústria da moda, os parques temáticos, os jogos esportivos, a Internet, a televisão, os estilos musicais e a literatura explodiram nas últimas décadas. Portanto, esperávamos que nossa geração fosse a que vivesse o mais intenso oásis de prazer e 34 tranquilidade. Mas nós nos enganamos, jamais fomos tão tristes e inseguros. Muitas pessoas precisam de inumeráveis estímulos para sentir migalhas de prazer. Dantas (2008) afirma que o discurso sobre o sofrimento psíquico passou a atuar na vida cotidiana, de uma forma nunca vista, a partir dos anos 80 do séc. XX, tornando-se foco de intensa preocupação social, política e de saúde mental. O que está ocorrendo? Quem deseja ter uma mente livre deve fazer questionamentos profundos. Um milhão de pessoas se suicidam por ano e dez milhões tentam e felizmente não morrem. Um número muito maior do que as vítimas nas guerras vigentes. 2. A solidão está se expandindo. As sociedades estão adensadas. No começo do século XX, éramos pouco mais de um bilhão de pessoas. Hoje, só a China e a Índia têm, cada uma, mais de um bilhão de habitantes. Por vivermos tão próximos fisicamente, pensávamos que a solidão seria estancada. Mas nos enganamos novamente, a solidão nos contaminou. As pessoas estão sós nos elevadores, no ambiente de trabalho, nas ruas, nas praças esportivas. Estão sós no meio da multidão. Moreira e Callou (2006) apontam que na contemporaneidade, apesar de seus grandes avanços científicos e tecnológicos e, sua expansão nos meios de comunicação, é possível notar uma crescente solidão no ser humano. Pois o estilo de vida individualista e consumista compromete fortemente a comunicação entre as pessoas. A solidão é, na atualidade, um dos mais graves problemas que desafiam a cultura e o homem, sinaliza Ruggero (2004 apud MOREIRA; CALLOU, 2006). 3. O diálogo está morrendo. Muitos só sabem falar de si mesmos quando estão diante de um psiquiatra ou psicólogo. Pais e filhos não cruzam suas histórias, raramente trocam experiências de vida. A família moderna está se tornando um grupo de estranhos, todos vivem ilhados em seu próprio mundo. 50% dos pais jamais conversaram com seus filhos sobre suas lágrimas, medos, angústias, pesadelos. Nas empresas e escolas as pessoas estão próximas fisicamente, mas infinitamente distantes interiormente. Perdas, angústias, medos, conflitos não são verbalizados. 80% das pessoas têm sintomas de timidez. Muitas pessoas tímidas são ótimas para os outros, mas costumam ser carrascos de si mesmas. 35 4. As discriminações chegaram a patamares insuportáveis. Infelizmente, nos dividimos, discriminamos e excluímos de múltiplas formas. Não honramos o espetáculo das ideias, nossa capacidade de pensar, o fascinante funcionamento da mente humana. Não poucas vezes não é a discriminação imposta pelos outros que mais perturba, mas a autodiscriminação. Você se autodiscrimina ou se diminui? E quanto a sociedade, sente que as pessoas olham com preconceito? Esse preconceito o machuca muito ou pouco? Já chorou ou se revoltou por causa disso? 5. A qualidade de vida está se deteriorando. Quanto pior a qualidade da educação, mais importante será o papel da psiquiatria no terceiro milênio. Apesar dos avanços da medicina, da psicologia e da psiquiatria, o normal tem sido ser ansioso e estressado e o anormal tem sido ser tranquilo e relaxado. Segundo Nunomura (2004 apud PEREIRA; SILVA; SILVA, 2010) atualmente o estresse afeta inúmeras pessoas, principalmente na fase adulta, devido a este ser o período onde se concentram as maiores responsabilidades e pressões. O autor destaca também que o estresse tem sido considerado a “doença do século”, agrupando diversos fatores internos e externos ao sujeito, os quais se não forem controlados desde o início podem provocar muitas complicações à saúde. De acordo com Instituto de pesquisa social da Universidade de Michigan (USA) 50% das pessoas cedo ou tarde desenvolverão um transtorno psíquico como depressão, fobias, síndrome do pânico, estresse pós-traumático, psicoses, alcoolismo, farmacodependência. Um número assustador. Que tipo de sintoma por ventura tem: é ansioso, agitado, tenso? Sofre por antecipação? Acorda cansado, vive fatigado? Anda esquecido ou tem déficit de memória? Tem sintomas psicossomáticos (dores de cabeça, muscular, taquicardia, queda de cabelo, etc.)? PAINEL DE DEBATE DA PRIMEIRA FERRAMENTA Após cada ferramenta haverá um painel de debate. Esperamos que o debate já tenha ocorrido durante toda a exposição de cada ferramenta, mas, apesar disso, o programa FREEMIND trará sempre um painel de perguntas para trazer à lembrança pontos importantes. 36 1 - Você tem tido um romance com sua própria história? Qual o valor real que você dá para você mesmo? Em que lugar está na sua escala de valores? 2 – O que é ser forte ou maduro para o programa FREEMIND? 3 – O que é ser frágil ou imaturo para o programa FREEMIND? 4 – você é um especialista em compreender ou em julgar? Quando você passa por um sofrimento, seja ele qual for, você o enfrenta com maturidade e procura reciclá-lo e usá-lo para crescer ou foge dele? PAINEL DE EXERCÍCIOS DIÁRIOS Faça um relatório dos seus exercícios durante a semana. O que praticou e qual foi o resultado? Após cada ferramenta haverá uma recomendação de exercícios diários. É fundamental para o sucesso de cada participante que ele o pratique e faça um relatório diário. Não basta se encantar com a ferramenta, é necessário disciplina para incorporá- la. Antes de iniciar a exposição da próxima ferramenta, o facilitador deveria pedir para os participantes comentarem pelo menos uma de suas práticas semanais. 1 – Escreva os princípios filosóficos que você mais precisa treinar, assimilar e trabalhar. 2 - Treine a cada momento compreender mais e julgar menos, agradecer mais e criticar menos. 3 - Treine diariamente usar seus erros não para se punir, mas para amadurecer, compreender as limitações da existência e ser mais tolerante com os outros. 4- Exercite encarar suas frustrações e decepções com maturidade. Jamais esqueça que não há céus sem tempestades, nem caminhos sem acidentes. Comente as experiências que teve na semana. 5 - Equipe seu Eu para nunca desistir de você e nem das pessoas que ama. Os fortes são obstinados, determinados, ouvem o inaudível e veem o invisível, por isso sempre dão uma nova chance para si e para os outros. Relate se durante a semana você vivenciou essa ferramenta. 4.2 Segunda ferramenta do FREEMIND O EU COMO AUTOR DA PRÓPRIA HISTÓRIA 37 Ser Autor da sua História é ser: 1. Capaz de reconhecer que cada ser humano é um ser único. 2. Gestor dos pensamentos. 3. Protetor das emoções. 4. Filtrador dos estímulos estressantes. 5. Capaz de pensar antes de reagir nos focos de tensão. 6. Capaz de construir metas claras e lutar por elas. 7. Capaz de fazer escolhas e saber que toda escolha implica em perdas e não apenas em ganhos. 8. Capaz de tirar os disfarces sociais, ser transparente e reconhecer conflitos, fragilidades, atitudes estúpidas. 9. Capaz de não desistir da vida, mesmo quando o mundo desaba sobre si. 10. Capaz de liderar a si mesmo, não ser controlado pelo ambiente, circunstâncias e ideias perturbadoras. Introdução A educação clássica nos ensina a conhecer detalhes dos átomos que nunca veremos e planetas que nunca pisaremos, mas não nos ensina a conhecer o planeta que todos os dias respiramos, andamos, vivemos: o planeta psíquico. Ao longo da aplicação do programa você será encorajado a se autoconhecer, a se mapear. O autoconhecimento básico é fundamental para expandir o prazer de viver, superar a solidão, promover o diálogo interpessoal, estimular a formação de pensadores, enriquecer a arte de pensar, debelar o câncer da discriminação, prevenir a depressão, a síndrome do pânico, os transtornos ansiosos, a dependência das drogas. Você se conhece? Já entrou em áreas mais profundas de si mesmo? Tem medo de mapear suas fragilidades? Por sermos uma espécie pensante, temos tendência em cuidar seriamente daquilo que tem valor. Cuidamos do motor do carro para não fundir, da casa para não deteriorar, do trabalho para não sermos superados, do dinheiro para não faltar. Alguns se 38 preocupam com suas roupas; outros, com suas joias, e, ainda outros, com sua imagem social. Mas qual é o nosso maior tesouro? O que deveria ocupar o centro de nossas atenções? O carro, a casa, o trabalho, o dinheiro, as roupas, as viagens ou a qualidade de vida! Por incrível que pareça nossa qualidade de vida fica frequentemente em segundo plano. Sem ela, não temos nada e não somos nada, não somos mentalmente saudáveis, emocionalmente livres, socialmente maduros, profissionalmente realizados. Você cuida da sua qualidade de vida? Minayo (2000) associa qualidade de vida ao grau de satisfação encontrado na vida familiar, amorosa, social, ambiental e à própria existência, sendo que em todas as sondagens que são realizadas sobre essa temática se encontram valores não materiais, como amor, liberdade, solidariedade, inserção social, realização pessoal e felicidade. A autora acrescenta que o termo qualidade de vida abrange muitos significados, os quais traduzem conhecimentos, experiências e valores de sujeitos e sociedades em suas diferentes épocas e contextos culturais. A aeronave mental tem um péssimo piloto Você teria coragem de subir num avião e fazer uma longa viagem sabendo que o piloto não tem experiência, tem poucas horas de vôo? Relaxaria se soubesse que ele desconhece os instrumentos de navegação? Dormiria se ele não tivesse habilidades para se desviar de rotas turbulentas, com alta concentração de nuvens e descargas elétricas? Fiz essas simples perguntas numa conferência que dei sobre A Educação do Século XXI para cerca trezentos coordenadores de faculdades, reitores e pró-reitores do país, que representam um universo de mais de cem mil alunos universitários. É obvio que todos responderam que se sentiriam completamente desconfortáveis. Muitos sequer ousariam pisar nessa aeronave. Mas abaferramenta-os ao afirmar que embarcamos diariamente na mais complexa das aeronaves e que é comandada por um piloto frequentemente despreparado, mal equipado e mal educado e, portanto, sujeito a causa inúmeros acidentes. A aeronave é a mente humana e o piloto é o Eu. Se você entrar num avião de última geração ficará perplexo com a quantidade de instrumentos para dar apoio à navegação. Mas de que adianta haver tais instrumentos se o piloto não souber usá-los? De que adianta o Eu ter recursos para dirigir o psiquismo 39 ou intelecto humano se durante o processo de formação da personalidade não aprende os conhecimentos básicos desses instrumentos e as mínimas habilidades para operá-los? Ninguém é tão importante como os professores(as) no teatro social, embora a débil sociedade não lhes dê o status que merecem. Mas o sistema em que eles estão inseridos é estressante e não forma coletivamente seres humanos que têm consciência de que possuem um Eu, de que esse Eu é construído por mecanismos sofisticadíssimos, de que esses mecanismos deveriam desenvolver funções vitais nobilíssimas, e de que sem o desenvolvimento dessas funções ele poderá estar completamente despreparado para pilotar o aparelho mental, em especial quando abarcado por um transtorno psíquico mais grave, como a dependência de drogas, depressão e ansiedade crônica. E uma vez despreparado, será conduzido pelas tempestades sociais e pelas crises psíquicas. Será um barco a deriva, sem leme. Um Eu mal formado terá grandes chances de ser imaturo, ainda que seja um gigante na ciência; sem brilho, ainda que seja socialmente aplaudido; viver de migalhas de prazer, ainda que tenha dinheiro para comprar o que bem desejar; engessado, ainda que tenha grande potencial criativo. O que seu Eu faz com as turbulências emocionais? Deixa-as passar, desvia-se delas ou as enfrenta? Se fôssemos um piloto de avião, a melhor conduta talvez seria desviar-se das formações densas de nuvens, mas, como pilotos mentais, essa seria a pior atitude, embora seja a frequentemente tomada. Em primeiro lugar, porque é impossível o Eu fugir de si mesmo. Em segundo, porque, se o Eu exercitar a paciência para deixar as emoções angustiantes se dissiparem espontaneamente para seguir em frente, ele cairá na armadilha da autoilusão. A paciência, tão importante nas relações sociais, é péssima se significar omissão do Eu em atuar no gerenciamento das dores e conflitos psíquicos. Elas apenas aparentemente se dissiparão. Serão arquivadas no córtex cerebral (camada mais evoluída do cérebro) e farão parte das matrizes de nossa personalidade. Atuar é a palavra chave. Em terceiro lugar, porque poderão formar janelas traumáticas (Killer) duplo P (duplo poder: poder de encarceramento do Eu e de expansão da janela doentia). Estudaremos esse assunto, mas tais janelas aprisionam o Eu e o desestabiliza como gerente da mente humana. O Eu deveria saber usar instrumentos para o enfrentamento e reciclagem das tensões, angústias e mazelas emocionais. Mas as escolas do mundo todo não nos ensinam a usar esses instrumentos ou ferramentas. Que tipo de ferramentas você usa diante dos medos que furtam a tranquilidade? Os medos ou fobias vêm e aparentemente 40 vão embora depois de minutos ou horas, mas nos enganamos, eles não vão embora, ficam depositados nos bastidores da memória e pouco a pouco vão desertificando o território da emoção. A fobia é uma aversão irracional por insetos, elevadores (claustrofobia), falar em público (fobia social), por sua vez, a dependência de drogas é uma atração irracional por uma substancia. Tanto uma como a outra depende das janelas killer duplo P, produzidas por um registro superdimensionado de experiências doentias. Depois que se instalou e se expandiu essas janelas, cristaliza-se a dependência psicológica. A partir daí, o verdadeiro monstro não mais é a droga química, mas o arquivamento delas nos bastidores da mente. Esses arquivos é que controlam o Eu e “assombram” o usuário de dentro para fora. Estudaremos que as janelas killer não podem ser deletadas, apenas reeditadas. Por isso, superar a dependência não é uma tarefa simples ou mágica, é muito mais do que se afastar das drogas. Depende de treinamento, educação e psicoterapia. Bonadio (2011) afirma que a dependência química por ser uma condição crônica apresenta demandas diversificadas dos pacientes ao longo do tempo, por isso é imprescindível o estabelecimento de novas metas e também uma revisão nas estratégias de reabilitação mais adequadas para atingi-las, partindo do pressuposto de uma constante avaliação de necessidades. E que tipo de atitude o Eu toma diante do humor depressivo que esmaga o encanto pela existência? E dos estímulos estressantes que tira-nos do ponto de equilíbrio? E dos pensamentos antecipatórios, da ansiedade e irritabilidade? Infelizmente o Eu é treinado a ficar calado no único lugar que não se admite ficar quieto. É adestrado para ser submisso no único lugar em que não se admite ser um servo. É aprisionado no único ambiente em que só se é inteligente, saudável e feliz se for livre. O seu Eu cala-se ou grita dentro de você. É líder ou servo dos seus pensamentos perturbadores? Não seja rápido em responder. Pergunte se você não sofre por problemas que ainda não aconteceram. Os tipos de dependência Esse programa objetiva, como foi comentado, o desenvolvimento das funções complexas da inteligência, para promover a saúde emocional e prevenir transtornos mentais, incluindo a dependência de drogas. A dependência das drogas é uma doença 41 psíquica grave, que desertifica o prazer de viver e encarcera o ser humano na sua própria mente, no único lugar que ele deveria ser livre. A quase totalidade dos usuários de drogas não tem a mínima ideia do desastre nos solos do inconsciente que as drogas causam. Apesar disso, é possível reciclar as janelas traumáticas que produzem compulsão e dependência pelas drogas, superar o cárcere da emoção e encontrar a mais plena liberdade. Uma tarefa difícil, mas plenamente possível, que, como sempre enfatizaremos, exigirá educação, exercícios intelecto/emocionais diários e treinamentos. Vejamos os dois tipos básicos de dependência que as drogas lícitas e ilícitas causam. Dependência física: é a capacidade de uma droga de não apenas produzir efeito psicológico, mas participar do metabolismo do organismo, a tal ponto que sua ausência produz uma síndrome de abstinência, caracterizada por delírios, alucinações, dores pelo corpo, diarreias, vômitos, cefaleia (dores de cabeça), alterações cardiovasculares. A heroína e o álcool etílico são exemplo de duas drogas que produzem alta dependência física. A dependência física da heroína pode se instalar em uma semana. É usada frequentemente injetável. As bebidas alcoólicas podem demorar meses ou anos, dependendo da frequência do uso, do tipo de organismo e do teor alcoólico das bebidas ingeridas. Dependência psicológica: é a capacidade de uma droga produzir efeito psicológico intenso e rápido, gerando matrizes traumáticas no córtex cerebral, aqui chamadas de janelas Killer duplo P: poder de fechar o circuito da memória e encarcerar o Eu e poder de descolar a personalidade, levando-a a ser dependente, insegura, frágil. Essas janelas traumáticas produzem uma necessidade compulsiva (“fissura”) pelo uso de uma nova dose da droga. Quando o usuário deixa de usá-las por um determinado período abrem-se algumas dessas janelas Killer duplo P nos solos do inconsciente, o que gera uma atração intensa e irracional por elas, traduzida por uma rica sintomatologia: ansiedade, insônia, humor depressivo, emoção aflitiva, irritabilidade, angústia. Frequentemente o usuário não identifica esses sintomas como sendo da dependência psicológica da droga que está usando, mas como problemas existenciais que está atravessando. Esta falta de identificação agiganta o monstro da dependência ao longo do tempo. Exemplo de drogas que provocam dependência psicológica é o crack e a cocaína. Nunca devemos nos esquecer que toda droga que produz dependência física produz também dependência psicológica. Mas nem toda que produz dependência psicológica produz dependência física. O crack e a cocaína por apresentarem graves 42 sintomas psicológicos, mas não apresentarem dependência física significativa, ou seja, por não gerarem sintomas orgânicos importantes com a abstinência (dores pelo corpo, tremores, náuseas, aumento da temperatura), leva o usuário a ter a falsa ideia de que está no controle do uso, o que, infelizmente, o conduz a afundar na lama da dependência, levando-o frequentemente a reconhecer que está doente ou dependente numa fase mais grave. A heroína, ao contrário, por causar alta dependência física, em poucos dias leva o usuário a sentir em seu corpo os terríveis efeitos da abstenção da droga, conduzindo-o a ter mais humildade para reconhecer que está dependente, o que o faz procurar ajuda mais rapidamente. Drummond e Drummond-Filho (2004) sinalizam que apenas 10% dos usuários de drogas desenvolvem dependência, ou seja, não são todas as pessoas que usam drogas que são dependentes. Isso ocorre porque a relação de cada indivíduo com a droga é muito distinta internamente, sendo que os dependentes químicos desenvolvem uma relação de total dependência da droga, depositando nela toda sua motivação e controle de sua vida. Já os nãodependentes conseguem ter a atitude de parar o consumo ao perceber os estragos que a mesma provoca em sua vida, seja no trabalho, nas relações familiares ou em sua vida social. Que tipo de droga você usou? Qual foi a escalada ou as drogas que passou? Quais foram os sintomas físicos e psíquicos mais importantes que sentiu quando interrompeu o uso? Você dirige a sua vida? Falta-lhe honestidade para reconhecer sua fragilidade e dependência? Dê uma nota de zero a dez que reflete seu nível de honestidade consigo mesmo. Pegue uma folha de papel e faça um relatório sobre as respostas a essas perguntas. Saiba que a superação do uso de drogas, a educação da emoção e a ressocialização do usuário exige grande empenho! Uma MENTE LIVRE (FREEMIND) exige entrega absoluta para um novo projeto de vida. Nenhum psiquiatra, psicólogo, educador, colaborador, pode fazer isso por você. Uma mente saudável não exige que sejamos heróis As mudanças na psique humana não aceita atos heroicos. Se você disser que de hoje em diante será livre, tolerante, generoso, seguro, tranquilo, bem humorado, provavelmente sua intenção heroica se dissipará como água no calor dos problemas que 43 enfrentará. Até um psicopata tem, em alguns momentos, intenção de mudar sua história, mas falha. A verdadeira liberdade é um treinamento que se conquista dia a dia, formando, como veremos, plataformas de janelas light (formadas por experiências saudáveis), que alicerçam o Eu como gestor de nossas mentes e como autor de nossas histórias. O FREEMIND é um projeto que clama que cada ser humano possua uma rica história que contenha lágrimas, alegrias, falhas, coragem, timidez, ousadia, insegurança, sonhos, sucessos, frustrações, solidão, dependência doentia. Você é um ser humano complexo. A última fronteira da ciência é desvendar como pensamos, qual a natureza e os tipos de pensamentos, como o Eu desenvolve a consciência e pode ser o gestor de nossas mentes. Nossa espécie tem o privilégio de ser uma espécie pensante entre milhões de espécies na natureza, mas, infelizmente, ela nunca honrou adequadamente a arte de pensar. As discriminações que sempre mancharam nossa história são um testemunho evidente de que não honramos essa fascinante arte. Infelizmente, pela falta de compreensão do espetáculo da vida e dos segredos que nos tecem como seres que pensam, sempre nos dividimos. A paranóia de querer estar um acima do outro e as guerras ideológicas, comerciais e físicas são reflexos de uma espécie doente e dividida. Não percebemos que, no teatro da nossa mente, somos todos iguais. Não somos judeus, árabes, americanos, brasiferramentaros, chineses. Somos seres humanos, pertencentes a uma única e fascinante espécie. Temos diferenças culturais, mas os fenômenos que constroem as cadeias de pensamentos e transformam a energia emocional são exatamente os mesmos em todo ser humano. Por isso, toda discriminação é desinteligente e desumana. Todos somos artistas no teatro da vida Talvez você nunca tenha ouvido falar sobre isso, mas se apaixonar pela vida e pela espécie humana são condições fundamentais para se ter alta qualidade de vida e sabedoria. Por favor, lembre-se sempre disto: 1- A vida que pulsa dentro de nós, independente de nossos erros, acertos, status e cultura é uma joia única no teatro da existência; 44 2- Cada ser humano é um mundo a ser explorado, uma história a ser compreendida, um solo a ser cultivado. É uma atitude irracional valorizarmos alguns artistas de Hollywood, políticos e intelectuais e não valorizarmos na mesma estatura nossa indecifrável capacidade de pensar. Afinal de contas, todos somos grandes artistas no anfiteatro da nossa mente. Que espécie é essa em que alguns são supervalorizados e a maioria é relegada ao rol dos anônimos? Isso é uma mutilação da inteligência. Muitos podem não ter fama e status social, mas para a ciência todos somos igualmente complexos e dignos. A rainha da Inglaterra nunca teve mais valor nem mais complexidade intelectual do que um miserável das ruas de Londres. Einstein e Freud não tiveram mais segredos psíquicos do que um faminto do terceiro mundo, um dependente de drogas ou um criminoso. Essa é uma verdade científica. Quando você lê sua memória em milésimos de segundos e escolhe, sem saber como, as informações em meio a bilhões de opções em seu inconsciente para construir uma única ideia, você está sendo um grande artista. Você crê nisso? Supervalorizar uma minoria de intelectuais, artistas, políticos, empresários pode ser tão traumático quanto discriminar. Respeitar e tomar algumas pessoas como modelo é saudável, mas supervalorizá-las bloqueia nossa inteligência e capacidade de decidir. Hitler foi supervalorizado. As consequências foram trágicas. A primeira grande ferramenta da qualidade de vida do programa FREEMIND é: ser autor da sua história. Para ser autor da sua história, é necessário primeiramente enxergar a grandeza do psiquismo humano e nunca se diminuir, se inferiorizar ou ser um coitadista que tem pena de si mesmo, que fica procurando culpados pelos nossos conflitos. Ainda que haja culpados, o importante não é ir a caça às bruxas fora de nós, mas encontrar os fantasmas em nossas mentes e reciclá-los, reeditá-los, eliminá-los. Um Eu que é coitadista esmaga sua coragem para reescrever sua história. Em segundo lugar, deve ter consciência de que na essência psíquica somos iguais e nas diferenças nos respeitamos. Uma pessoa madura não exige que os outros tenham a mesma crença, pensamento, cultura e modo de vida que temos. Em terceiro lugar, deve aprender gerir seus pensamentos e emoções, ferramentas que trataremos nos próximos capítulos. Ninguém pode ser um grande líder no teatro social se primeiramente não o for no teatro psíquico. Ter a capacidade de gerenciar as emoções, de acordo com Mayer e Salovey (1999 apud MUNIZ; PRIMI, 2007), envolve adquirir tolerância às experiências 45 emocionais mais intensas e também obter o conhecimento e emprego efetivo de estratégias de alterações desses sentimentos. Sendo assim com o passar do tempo pode tornar-se possível entender as reações emocionais, avaliando-as, controlando-as e compreendendo-as. O resgate da liderança do Eu Muitos confundem o significado do Eu. Mesmo nas teorias psicológicas, há uma carência de definição adequada. De acordo com a teoria da Inteligência Multifocal, o Eu representa a nossa consciência crítica, nossa vontade consciente e capacidade de decidir. O Eu é a nossa identidade. Não é um mero realizador de tarefas, eu posso, quero, faço. O Eu é a nossa capacidade de analisar as situações, duvidar, criticar, fazer escolhas, exercer o livre-arbítrio, corrigir rotas, estabelecer metas, administrar o psiquismo. Agrônomos discutem microelementos para nutrir as plantas, médicos debatem sobre moléculas medicamentosas, economistas discorrem sobre medidas para controlar o fluxo de capitais internacionais, mas não sabemos quase nada sobre como formar o Eu como diretor psíquico. O sistema acadêmico nos prepara exercer uma profissão e para conhecer e dirigir empresas, cidades ou estados, mas não a nós mesmos. Essa lacuna gerou déficits gritantes na formação do Eu, que por sua vez, se tornou um dos importantes fatores que fomentaram as falhas históricas do Homo sapiens. Não é loucura um mortal produzir guerras e homicídios? O caos dramático da morte perpetrado na solidão de um túmulo deveria produzir um aporte mínimo de sabedoria para o Eu para controlar sua violência, mas não é suficiente. Um Eu infantil, pouco dado a interiorização, postula-se como deus. Não é estupidez um ser humano que morre um pouco a cada dia ter a necessidade neurótica de poder como se fosse eterno? Não é estupidez um homem que não sabe como gerenciar seus pensamentos ter a necessidade ansiosa de controlar os outros? Não é uma barbaridade querer ser o mais rico, famoso ou o mais eficiente profissional no leito de um hospital? Ninguém quer isso. Mas por que muitos que têm espetacular sucesso social e financeiro, ao invés de relaxar e se deleitar, continuam num ritmo alucinado, procurando metas inalcançáveis? Um Eu competente não quer dizer um Eu bem formado. Um Eu mal formado pode ser eficientíssimo para o sistema social, mas, simultaneamente, ter uma péssima relação consigo mesmo. 46 Há pessoas que tiveram pais fascinantes, uma infância maravilhosa e privada de traumas, mas tornaram-se tímidas, pessimistas, mal humoradas, ansiosas. A base de sua personalidade não justifica sua miserabilidade. Para entendê-las temos de observar os mecanismos de formação do Eu. E para que elas superem essa miserabilidade não adianta tratar de uma doença, mas do Eu doente, do Eu como gerente da psique.

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